quarta-feira, 25 de maio de 2011

Conheça um pouco melhor a construtora ARG, que presta serviços para a NUCLEP.

Construtora ARG, de Belo Horizonte, sacou R$ 102 milhões em dinheiro vivo do banco rural e documento do ministério público a vincula ao mensalão.

Era uma obra pequena para os padrões nacionais, a construção do aeroporto de Jaguaruna, sul de Santa Catarina. Um contrato de R$ 20,4 milhões, de uma construtora pouco conhecida, a ARG, de Belo Horizonte. Um dia uma auditoria do Tribunal de Contas da União apareceu por lá e verificou um superfaturamento de R$ 4,3 milhões. Os auditores abriram processo no TCU em Brasília e mandaram uma cópia da papelada para o Ministério Público no Estado de Santa Catarina. Os procuradores catarinenses constataram que a ARG já tinha registro de outras irregularidades em obras federais. Eles pediram então à Justiça Federal de Santa Catarina a quebra do sigilo bancário da construtora. Foi uma briga judicial de dois anos. Em fevereiro deste ano, a 7ª Turma do Tribunal Regional Federal, no Rio Grande do Sul, mandou quebrar o sigilo da empreiteira e dois meses depois os extratos chegaram a Porto Alegre. Estão todos lá, sem segredo de Justiça. E o que mostram? Que entre 2002 e 2005 a construtora ARG sacou R$ 102 milhões, em dinheiro vivo, do Banco Rural. Mais: na agência do Rural de Belo Horizonte, com o mesmo gerente que operou para o famoso Marcos Valério, Lucas da Silva Roque. O MP passou a achar, então, que pode não ser mera coincidência.

Na semana passada, toda a documentação das contas da empreiteira chegou às mãos do procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza. "O dinheiro público entregue à ARG desaguou, precisamente, no núcleo operacional e financeiro do mensalão, qual seja, o Banco Rural", registra o ofício do MP a Antônio Fernando, assinado por um dos procuradores do caso, Celso Antônio Três. "A par dos momentosos desvios através de empreiteiras (v.g., Operação Navalha), claro está aqui outra fonte de financiamento do mensalão", acrescenta o ofício. O MP de Santa Catarina enviou outras cópias da documentação para a Polícia Federal e o MP em Minas a fim de aprofundar as investigações. Os procuradores pediram à PF para investigar as atividades financeiras dos três sócios da empreiteira ARG: Adolfo Geo, Adolfo Geo Filho e Rodolfo Giannetti Geo. Procurado por ISTOÉ, Rodolfo Giannetti Geo admitiu os saques em dinheiro vivo, mas negou que tenham qualquer irregularidade ou relação com o mensalão. "Os valores sacados em conta corrente da ARG são utilizados para pagamento de suas legítimas operações comerciais", explicou Rodolfo Geo. Ele não quer, no entanto, comentar como foram utilizados os R$ 102 milhões sacados no Banco Rural. Além da construtora, os Geo têm lojas de pneus e criação de peixes.

Na célebre denúncia do mensalão, aquela que indicia 40 membros de uma suposta "organização criminosa", o procurador- geral da República, Antônio Fernando de Souza, cita a ARG, na página 92. Esse trecho da denúncia faz referência a uma vistoria do Banco Central demonstrando que o Banco Rural estava envolvido em "uma série de operações ilegítimas, contabilizadas de forma a mascarar a verdadeira natureza da operação, encobrindo a lavagem de dinheiro resultante de crimes contra o Sistema Financeiro Nacional". Um processo do Banco Central revela que a ARG Ltda. estaria envolvida em "outras situações caracterizadoras de práticas fraudulentas". Como nada mais tinha sobre a construtora quando redigiu a denúncia, o procurador enviou os documentos para apuração no Ministério Público de Belo Horizonte. A grande descoberta, contudo, surgiu agora, extraída do processo de superfaturamento na obra do aeroporto Jaguaruna, que tramita na Justiça Federal em Porto Alegre. São documentos relativos a 1.800 saques em dinheiro vivo, com valores que variam de R$ 10 mil a R$ 1 milhão, num inquérito que já soma 35 mil páginas.

A ARG é velha conhecida das autoridades federais. O grande nicho de mercado da construtora mineira são obras concedidas pelo Departamento Nacional de Infra-estrutura de Transportes, o DNIT. A construtora tem hoje 11 grandes obras em andamento no país, das quais sete são contratos diretos com o DNIT. São obras de duplicação, restauração e pavimentação de rodovias. Segundo pesquisa do site Contas Abertas, a ARG Ltda. recebeu R$ 246 milhões do governo de 2002 a 2005. No TCU há cinco decisões dos ministros acusando as obras da ARG de licitação direcionada e superfaturamento. Num dos processos, o TCU calcula que uma obra tocada pela empreiteira, um trecho da BR-342 entre Minas e Espírito Santo, foi superfaturada em 83,84%. Em outro processo, o do contorno ferroviário de Jaraguá do Sul (SC), o TCU calcula que o valor do prejuízo ao erário foi de R$ 33 milhões. O diretor nacional do órgão, Mauro Barbosa, disse, por intermédio de sua assessoria, que "nenhum tribunal considera a empresa ARG inidônea juridicamente". A Construtora Gautama também era juridicamente idônea - até estourar a Operação Navalha.

"Os valores sacados são utilizados para pagamento de legítimas operações comerciais", diz o sócio Rodolfo Geo

O TCU calcula que um trecho da BR-342 tocado pela ARG foi superfaturado em 83,84%

Fonte: Revista Isto é

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Documentário denuncia desastre ambiental na Ilha da Madeira, em Itaguaí, no litoral fluminense.

 

Foto de arquivo do passivo ambiental da Companhia Mercantil e Industrial Ingá

Foto de arquivo do passivo ambiental da Companhia Mercantil e Industrial Ingá

Documentário denuncia desastre ambiental em ilha fluminense – As agressões ambientais ocorridas na Ilha da Madeira, em Itaguaí (RJ), e as consequências na vida dos pescadores do local são o tema central do documentário Território de sacrifício ao deus do capital: o caso da Ilha da Madeira. O vídeo foi produzido por pesquisadores da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz) e mostra como a vida dos moradores da ilha foi afetada com a chegada de grandes empreendimentos econômicos à região do Porto de Itaguaí.

Considerada estratégica economicamente por estar localizada entre os maiores centros industrias do país e sediar um dos maiores portos do Brasil, a região sofreu grandes impactos ambientais a partir da década de 1950. Além das indústrias que se instalaram na própria Ilha da Madeira, as empresas do entorno também geram vários poluentes industriais que trazem consequências para a vida, o trabalho e a saúde dos moradores da localidade.

O nome do documentário é uma referência ao termo “Zona de Sacrifício”, utilizado por alguns autores para definir áreas determinadas pelo poder público para receber empreendimentos econômicos. Normalmente, são regiões vulneráveis socialmente, com população de baixo nível socioeconômico. “No caso da Ilha da Madeira, os moradores e pescadores foram coagidos pelo poder público a aceitar as indenizações e imposições das empresas. Eles minam as resistências da população para que ela aceite coisas como se mudar de suas casas, por exemplo, para abrir espaço para a instalação das indústrias”, conta Marcelo Bessa, coordenador do projeto de pesquisa A construção compartilhada de cenários exploratórios e prospectivos entre atores envolvidos em conflitos socioambientais – o caso do passivo ambiental da Companhia Mercantil e Industrial Ingá, que gerou o filme.

A ideia de produzir o documentário foi dos próprios moradores que participaram da pesquisa e queriam dar mais visibilidade à situação que enfrentam. “Muitos relatam que se sentem invisíveis e sem identidade. Eles dizem que o poder público mudou até o nome da Ilha da Madeira, que é muito associada a conflitos ambientais, e passaram a chamar de Porto de Itaguaí”, diz Marcelo.

No filme, moradores e pescadores da ilha fazem relatos sobre o conflito ambiental e como isso afeta suas vidas. Eles contam como era a ilha antes da chegada das indústrias e falam sobre as pressões feitas pelo poder público para que os moradores deixem suas casas e abram espaço para a instalação das empresas. “Todo o filme foi feito com a colaboração dos moradores, que participaram de diversas oficinas durante a produção do documentário e ajudaram a elaborar o roteiro do vídeo”, disse Marcelo, acrescentando que será realizada uma sessão especial para que os moradores possam assistir ao resultado final. O documentário foi dirigido por Fabiana Melo Sousa, do Laboratório Territorial de Manguinhos (LTM) e teve o apoio do Núcleo de Tecnologias Educacionais (Nuted) da EPSJV. O documentário estará disponível, em breve, no site da EPSJV e também poderá ser solicitado por pessoas ou instituições que tenham interesse no vídeo gerado pela pesquisa.

Ilha da Madeira e Ingá

A Ilha da Madeira é um bairro do município de Itaguaí (RJ), reduto tradicional de pescadores, que hoje tem cerca de três mil habitantes. Inicialmente, a localidade foi habitada por portugueses que a batizaram com o mesmo nome da ilha portuguesa. Na década de 1950, a ilha foi ligada ao continente por meio de um aterro, para facilitar o acesso ao local.

A Companhia Mercantil e Industrial Ingá, que era beneficiadora de zinco para exportação, se instalou na Ilha da Madeira na década de 1950 e encerrou suas atividades no final dos anos 1980, quando faliu. Durante esse período, a Ingá criou um grande passivo ambiental para a localidade, pois, para a produção do Zinco, que é extraído da Calamina (um tipo de minério), há um processo industrial que gera subprodutos como zinco, cádmio e níquel, entre outros. Esses resíduos, que chegaram a 3,5 milhões de toneladas, eram depositados em uma lagoa artificial, criada pela empresa e ligada à Baía de Sepetiba, e causaram a contaminação do solo, da água subterrânea, da água do mar, dos manguezais e da própria Baía. “A relação entre a Ingá e os pescadores sempre foi conflituosa e, com o passar dos anos, só piorou. São duas atividades difíceis de conciliar: uma é industrial e poluente e a outra é extrativa e artesanal”, explica Marcelo.

A Ingá chegou à Ilha da Madeira antes da criação da Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente (Feema), atual Instituto Estadual do Ambiente (Inea), o que ocorreu na década de 1970. “A empresa se instalou antes de existir uma política estadual de controle ambiental. Depois, a Ingá foi notificada várias vezes pela Feema, mas continuou poluindo”, destaca Marcelo.

Com a falência da Ingá e o fim de suas operações na Ilha da Madeira, o poder público elegeu um síndico para administrar a massa falida e o passivo ambiental da empresa, incluindo as indenizações dos moradores prejudicados pela atividade industrial. Em 2008, a Usiminas arrematou a massa falida da Ingá em um leilão. Com isso, a Usiminas teria, entre outras coisas, que indenizar os moradores, mas esse leilão gerou ainda mais conflitos e é questionado por diversas ações judiciais.

Projeto

O projeto de pesquisa “A construção compartilhada de cenários exploratórios e prospectivos entre atores envolvidos em conflitos sócio-ambientais – o caso do passivo ambiental da Companhia Mercantil e Industrial Ingá” foi iniciado no ano passado e concluído em 2010, financiado com recursos da Coordenação Geral de Vigilância em Saúde Ambiental do Ministério da Saúde. Os pesquisadores do Laboratório de Educação Profissional em Vigilância em Saúde (Lavsa) da EPSJV trabalharam em conjunto com as associações de pescadores da localidade – Associação de Pescadores e Lavradores da Ilha da Madeira (Aplim) e Associação de Pescadores Artesanais da Ilha da Madeira (Apaim). “O objetivo do projeto era desenvolver uma metodologia participativa, que possibilitasse aos moradores da região uma melhor capacidade de denúncia e de organização em seu território. Nossa intenção era conhecer os interesses, preocupações e percepções dos envolvidos no conflito ambiental da Ilha da Madeira”, explica Marcelo.

Por meio de entrevistas semi-estruturadas, grupos focais, oficinas de planejamento local e pesquisa documental, os moradores foram estimulados a falar sobre sua realidade e seu futuro, reconhecendo seus problemas e propondo soluções. Nas falas, os pescadores identificaram como principais problemas da ilha as transformações acontecidas no território, com a instalação das empresas e do porto, e a degradação do ecossistema marinho e do ambiente urbano.

Uma das consequências diretas no cotidiano dos moradores é que, com a instalação do Porto de Itaguaí e, futuramente, do Porto Sudeste e de um estaleiro da Marinha, a área de navegação é cada vez mais restrita, reduzindo o espaço de trabalho dos pescadores. “Além da contaminação, que diminui a qualidade e a quantidade do pescado, ainda há a restrição da produção. Alguns tipos de frutos do mar, como as ostras, mariscos e camarões são altamente vulneráveis à contaminação. O mangue também está totalmente contaminado porque o sedimento poluente se deposita no leito dos rios”, observa Marcelo.

O não pagamento das indenizações devidas aos moradores por causa do passivo ambiental da Ingá também é apontado pelos moradores como um dos principais problemas. Como soluções para os problemas identificados, os moradores indicam a maior mobilização da comunidade, maior publicização dos problemas, a revisão dos processos de indenização e a implantação de projetos para cultivo de mexilhões e criação de algas marinhas, para gerar renda para os habitantes do local.

Reportagem de Talita Rodrigues, da Agência Fiocruz de Notícias, publicada pelo EcoDebate16/06/2010